[…] a poesia será sempre uma espécie de «contra-música» da respiração do mundo.
O horizonte — o próximo e o distante — dos três ensaios deste livro é o da desconstrução da ideia do poema como lugar e motor de qualquer forma de utopia, e da impossível resposta à questão «O que é a poesia?». Uma vez que a poesia não existe, prefiro dirigir o olhar para a configuração do poema como matéria do puro possível, aquela que vive da tensão do aberto e melhor evidencia a «potência sem acto» da linguagem, ou a sua «pujança sem poder», aquilo que, no discurso da poesia, devém hoje para o quase-nada e não parece querer devir para outro lugar que não seja o do apagamento de sentidos definitivos. «A potência dos poetas», escreve Maria Gabriela Llansol num dos cadernos inéditos, «é uma fonte» — e não um dado adquirido ou uma qualquer forma de poder do poema sobre o mundo. Mas se for escrita do mundo (em que ela própria se inclui), mais do que mera grafia do Eu, a poesia será sempre uma espécie de «contra-música» da respiração do mundo. É também assim que ela é vista nos ensaios deste livro — e, em consonância com eles, nas fotografias de Maria Etelvina Santos que o acompanham.
[João Barrento]