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Maurice Renard
Destinado na literatura a domador de perigos, Maurice Renard desde cedo se imaginou […] como um escriba de milagres. Tinha nascido no último dia de Fevereiro de 1875; e, segundo consta no seu registo baptismal, em Châlons-sur-Marne; mas perto de Reims, em Hermonville, é que ele viveu a sua infância apertada pela severidade das tradições e dos preconceitos, incitada a seguir um tom de família visto como superior exemplo de prestígio social; a amar aquele luxo de magníficos cavalos; a saber-se servido pela comodidade de um grande número de bem treinados empregados domésticos. Desviado para Paris como aluno da privilegiada instrução da escola Monge, mostrou-se primeiro classificado em composição francesa e… quem tal diria… em ginástica. E é nesta distância, neste descanso das regras familiares de Hermonville, que ele se arrasta para lá de Sindbad e chega ao Edgar Poe tão bem recriado por Baudelaire; que está numa intimidade de leitura com as imaginações de Hoffmann e com o lobisomem de Erckmann-Chatrian. Renard cumpre «o dever» de um bacharelato em letras e em filosofia; e, depois dele, um outro em estudos de Direito que não conclui porque muito pouco lhe dizem os advogados e os tribunais; chega também a pressentir-se militar, mas a rigidez hierárquica dos exércitos refaz-lhe antigas e pouco apetecíveis sensações de Hermonville que não se conciliam com o seu desejo de liberdade. […] voou na vida até ao 18 de Novembro de 1939; o dia em que foi vítima das consequências de uma operação cirúrgica menos eficaz do que a outra, a do pianista que ele celebrizou em As Mãos de Orlac. Ficou no cemitério da ilha de Oléron — um ventoso sul de França que em dias passados oferecia ostras aos seus prazeres da mesa, e ao seu sono noites batidas pelo som do mar; o mar que ali parece exprimir-se com uma insondável revolta — e não dá descanso às suas costas selvagens. [Aníbal Fernandes] ARTIGOS RELACIONADOS
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