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Conde de Mirabeau

[…] tinha-lhe sido dado o nome Honoré Gabriel Riqueti de Mirabeau [9/3/1749 – 2/4/1791); era o primogénito de Victor Riqueti, economista e marquês de Mirabeau. E quando a criada de quarto de Marie-Geneviève de Vassan lhe entregou depois do parto o filho acabado de nascer, mostrou-se muito prudente com esta frase:

— Não vos assusteis, senhora.

Mostrava-lhe e encaixava-lhe nos braços uma criança de grande cabeça, tomada nos seus primeiros anos de vida por um sintoma de hidrocefalia. À fealdade fisionómica (que Victor Hugo, no seu Étude sur Mirabeau veio a definir como «grandiosa e fulgurante», secundada pelo «pé torto, dois grandes dentes e a enorme cabeça»), acrescentemos-lhe as marcas da varíola que desde os três anos de idade maus enfeites lhe deixaram na pele do rosto. É do seu pai a crueldade deste fraternal aviso: «Aí vai um sobrinho vosso, tão feio como o de Satanás.» (Má sorte física, que bem pouco encontramos na benevolente visão dos seus retratistas.)

Se o velho marquês quis ver o seu filho protegido pelas dignidades de uma honrosa carreira militar, bem cedo ele se mostrou com uma rebeldia que a tudo opôs vultuosas dívidas não pagas, devassidões e escândalos. Logo aos dezoito anos de idade entrou no seu currículo bélico uma guerra na Córsega; e, coisa curiosa a provar-nos que a sorte nos amores pouco se atém às belezas do físico: conquistou uma amiga íntima do coronel do seu regimento. A ira paterna — trovejante e digna de um marquês de romance — levou-o a pedir, e a conseguir para o seu filho, um encarceramento punitivo na ilha de Ré.

[…]

Nos seus nove meses de Amsterdão, o jovem conde de Mirabeau foi escritor e tradutor de textos ingleses assinados com o pseudónimo Saint-Mathieu. Mas a Justiça do seu país, incitada pelas diligências do marido atraiçoado, não foi lenta; a sua aventura foi juridicamente sentida como sedução de mulher casada e rapto, aquilo que a França punia com leis que condenavam à morte e ao gume da guilhotina. Houve em Maio de 1777 um pedido de extradição e a consequente entrega dos dois fugitivos a uma escolta policial; Mirabeau foi parar às masmorras de Vincennes; Sophie, grávida, foi acabar a sua gestação numa casa de saúde de Paris, e depois do parto expedida para Gien, onde tinha à sua espera uma decente reclusão no convento das irmãs de Santa Clara. Durante cinco anos, Sophie fez uma vida retirada, que só teve fim com a morte do seu velho marido; durante três anos e a poucas celas de distância do marquês de Sade, o conde de Mirabeau matou o tédio a escrever; e escreveu muito, e investigou muito; tudo o que lhe foi necessário para as suas ficções mais celebradas e pôr em livro as curiosas erudições da Erotika Biblion.

[…]

Quando morreu, a 2 de Abril de 1791, pôde encontrar-se como justificação um copo de vinho, delicioso mas envenenado. O seu funeral enfeitou-se com honras ditadas por Luís XVI (que só teria por mais um ano a cabeça presa ao pescoço), e o seu corpo foi transportado com grandes pompas para o Panteão; mas foi alguns meses depois encontrado o dito «armário de ferro» no palácio das Tulherias, com documentos que mostravam as suas relações com o rei e a rainha de Versalhes; a excitada correria de um povo que já executava os actos violentos da sua revolução, encaminhou-se para a sua sepultura; violou-a, despedaçou-a, e lançou-lhe os restos aos esgotos de Paris.

[Aníbal Fernandes]

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