«Admiro a escrita quase martelada, aparentemente pouco literária, indo direita ao assunto: escrita de engenheiro, dir-se-ia. Todavia, só aparentemente é assim, e foi essa ambivalência a razão da escolha da epígrafe [do meu artigo]: “(…) tanto tenho cosido paredes rasgadas que me sinto uma espécie de alfaiate dos prédios antigos, sempre de fatos à medida, sempre com boas linhas, agulhas e tesouras.”»
Raquel Henriques da Silva, no Prefácio
«Num dia de finais de 80, já percorridos muitos quilómetros de ruas e travessas, e vistos milhares e milhares de metros quadrados de edifícios quase todos anónimos e praticamente todos em mau estado, percebi também que tinha encontrado o meu destino, que definitivamente estava ali, na história desses edifícios e dessa cidade.»
«Há já muitos anos, a minha vida profissional foi-se encaminhando para novos destinos, quando fui deixando de ser especialista em estruturas, que nunca quis ser apenas, para me transformar, ou melhor, me ir paulatinamente transformando num generalista da construção, com interesse especial pela sua história e pelas histórias de vida dos edifícios que são, afinal, a história da própria cidade. E nessa caminhada, feita com gosto, mas muitas vezes a sós, Lisboa teve um papel central, talvez porque seja a minha cidade e a cidade que sinto como minha, nas suas paredes e nas calçadas, no seu ar simultaneamente chique e decadente, das tristezas que se desprendem dos seus fados, cruzados com a alegria de uma luz sem par. É sobretudo a Lisboa das colinas que me encanta, que tento ver de todos os ângulos possíveis, de miradouros, de largos e ruas, sobretudo quando se consegue não ver a degradação de tantos prédios, a vegetação a crescer nas casas abandonadas, saboreando a cascata de telhados de muitos vermelhos que parecem escorregar lentamente pelas encostas até irem beijar o vale e o rio.»
[João Appleton]
Fotografias de Pedro Tropa.