O pintor faz a pintura que parece que se faz a si mesma. Faz com que ela se faça.
Este catálogo foi publicado por ocasião da exposição Mare Æthiopicum, de Paulo Quintas, realizada na Giefarte entre 7 de Março de 2020 e 6 de Junho 2020.
Depois da sua muito extensa e indispensável (heterodoxa!) antológica, Todos os Títulos estão Errados, na Cordoaria, Paulo Quintas expôs […] novos trabalhos que desenvolviam pressupostos de sempre; estes trabalhos, outros trabalhos, talvez todos um pouco mais do que pinturas, também espaços, geografias de imagens, «rotas marítimas» imprevisíveis ou descobertas; sintetizaria assim: há sempre muito pouco que ver, ou que «alimente» a visão, na pintura do autor. Digamos de outro modo, creio e estou mesmo certo de que só há um tema na pintura de Paulo Quintas: a amostragem ou revelação do seu processo. E, ao mesmo tempo, só há um tema não mostrado nem revelado nesta pintura: precisamente a exibição ou revelação do seu processo.
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O pintor faz a pintura que parece que se faz a si mesma. Faz com que ela se faça. Logo, faz (um pouco de) tudo, e quanto mais simples é o processo menos a pintura se «faz» — e Paulo Quintas aprecia «fazer pouco» e escolher procedimentos básicos. Aliás, se a pintura se faz como a volta do «mar largo» o pintor não faz praticamente nada. Certo e errado.
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O círculo, sem princípio nem fim, forma peculiar, portanto, faz esta pintura circular em torno de si mesma. E, no final, revela-se camada inédita, imprevisível. Mas um imprevisível escolhido entre muitos e muitas hipóteses. O pintor escolhe um tipo de imprevisibilidade. A escolha certa: escolher as modalidades da perda. Cada tela é uma «tela certa» com título «errado». É uma afirmação sólida e desfeita pela vontade do pintor. A matéria apaga-se. Fica a forma. Exacta. No final desaparece a hesitação. Nunca há hesitação.
[Carlos Vidal]
Com a GIEFARTE.
Edição bilingue: português-inglês.