«O viajante do metropolitano de Lisboa, sendo mais provável que tenha nacionalidade portuguesa, sai na estação do Aeroporto da Portela e é surpreendido pelas caricaturas gigantes, a preto-e-branco sobre as paredes do cais, de quatro figuras políticas que ele bem conhece da recente história do seu país, cada uma delas de corpo inteiro, sentada numa cadeira de estilo clássico. O viajante de avião acabado de aterrar na capital, com grandes hipóteses de ser estrangeiro, desce ao comboio subterrâneo e fica do mesmo modo surpreendido, no amplo corredor de acesso à estação, pela distribuição, ao longo das paredes, de quase duas outras dezenas de caricaturas de personagens para ele desconhecidas — com a excepção, talvez, de Fernando Pessoa —, mas que adivinha, pela forte individualização fisionómica de cada uma delas, representarem gente viva, seja no passado ou no presente.
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Em finais do século XIX, Rafael Bordalo Pinheiro criou em folha de jornal o seu Álbum das Glórias, caricaturando personagens relevantes da sociedade portuguesa. Cinco gerações depois, António, em suporte mais resistente, segue-lhe os passos, actualizando a identidade das eminências portuguesas. Uma das personagens retratadas por Rafael foi o seu Zé Povinho, e mesmo esse António não deixou de fora, desenhando-o junto ao seu criador, como se fosse a 51.ª personagem deste painel. É o fecho de um ciclo, e Portugal que continua.» [Joaquim Vieira, «O novíssimo Álbum das Glórias»]
«Estes desenhos nas paredes da estação de metro do Aeroporto podem ser, para muita gente, uma surpresa, por virem de um autor conotado com a imprensa e aparecerem, aqui, fora desse contexto — e também por se tratar de caricaturas.
Se por um lado, a primeira razão, para os mais atentos, não é propriamente uma grande surpresa, já que há muito vinha fazendo incursões fora das páginas dos jornais, na escultura, na medalhística e no design gráfico; já a segunda é, seguramente, uma surpresa maior, tratando-se da caricatura a animar um espaço público — aventura nunca ousada em Portugal e também muito pouco frequente noutras paragens.
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Resta-me esperar pelas opiniões do público e da crítica e deixar aqui o meu reconhecimento às pessoas que, no Metropolitano de Lisboa, acreditaram e acarinharam este projecto.» [António Antunes, «Desenhos de pedra do centímetro ao metro»]