Uma última pergunta, que a série já vai longa: Botelho, se algum leitor destas linhas quisesse começar a pintar e lhe pedisse conselho, que faria?
[Mário Cesariny entrevista Carlos Botelho, O Rossio, n.º 1, 1952].
Esta antologia de entrevistas surgiu como forma de dar a conhecer, ou melhor, trazer para o corpo visível do livro entrevistas que pela proximidade fácil com o entrevistado (o Mário, por ele mesmo) se transformaram em «conversas» abertas, onde os temas, os nomes, as palavras surgem de um sopro de liberdade.
[Laura Mateus Fonseca]
Conheci Mário Cesariny em 1981. Tinha-lhe enviado o primeiro livro de poemas, edição de autor, ele escreveu-me de volta, sugerindo que o visitasse, o que fiz, movido pelo entusiasmo de ir ao encontro do Poeta que fora, no fim da adolescência, descoberta maior, nunca traída até hoje. O homem que encontrei, por uma tarde chuvosa, no modesto estúdio e refúgio, à Graça, chegava então aos 60 anos, mais trinta que os meus, o que, todavia, deixava de se fazer sentir assim que começava a falar, em digressões que passavam, sem descontinuidade, das memórias de vida a reflexões sobre Llull, Breton, Artaud. Tudo tinha a mesma origem. […] Homem só, sereno, capaz de uma gargalhada formidável, era soberano nessa solidão, indiferente a agradar, incapaz do que fosse para ir ao encontro de qualquer aplauso, de que desconfiava.
[Bernardo Pinto de Almeida]
Traquinas como é, brincalhão e travesso e feliz como uma criança num dia sem escola, apenas me disse ao telefone o seu penúltimo desejo e vontade:
Sabe, ó Prefeito, o que eu tenho pensado é vender parte da minha obra, comprar um carro enorme, contratar um chauffeur e viajar até ao dia da viagem definitiva.
Viajar, talvez, em busca daquele gato que um dia Risques Pereira viu como partia para a aventura com o ar elegante, distante e ausente que caracteriza e define aquele animal sagrado, dandy dos telhados, das açoteias e de lugares ainda mais altos, que, como diria Cesariny, os lepidópteros burgueses nunca conseguirão domar.
[Perfecto E. Cuadrado]
Com a Fundação Cupertino de Miranda.
Organização, introdução e notas de Laura Mateus Fonseca.
Prefácio de Bernardo Pinto de Almeida.
Posfácio de Perfecto E. Cuadrado.