Cada obra surge perante nós como uma pausa no devir do estado das coisas. A delicadeza de cada acto criativo não quer impor nenhuma forma ao mundo, não quer acrescentar nem subtrair nada, mas apenas apresentar um novo modo do ser das coisas.
De mexer na pintura o artista persegue o vício da descoberta. Imerge as mãos, procura fissuras, transparências, entradas de luz. Faz por iluminar o escuro denso da tinta, líquida, mas espessa. Toca primitivamente a matéria. Age dependente do mistério que se oculta, ensaiando uma atenção laboriosa que aprofunda ainda mais o mergulho. Em profundidade se deixa por muito tempo até que o pensamento se funde com o gesto e se instrumentaliza em função do trazer.
[Maria Joana Vilela]
Na pintura de Inês Teles encontramos pequenos jogos de percepção que nos colocam no campo de algumas grandes questões formais da história da arte que o modernismo explicitou: o entendimento (sempre por codificação e descodificação) da figura e do fundo, do suporte/superfície da obra (do seu corpo ou do seu dentro) e do espaço arquitectónico (mas também social) da sua apresentação, o entendimento da centralidade da composição e dos seus motivos (figuras) ou da sua deslocação dos eixos ortogonais, o entendimento da(s) cor(es) e dos modos de incorporação/revelação da luz, dos gestos de pintar e da sua performatividade…
[João Pinharanda]
Cada obra de Inês Teles em situação de exposição não pretende ser a afirmação de uma presença, não deseja ser um acto imperativo de inscrição, mas apenas a suspensão de um processo de transformação que não quer ser coercivo nem subjugar a matéria. As metamorfoses que se animam são inerentes à matéria, como quem perscruta e atende zonas de passagem de vida própria. Os sentidos das suas obras são halos dessas acções sensíveis de transformação, como quem recuou a um estado puro de alquimia, na relação directa com os materiais, para acolher os perfumes alquímicos da matéria.
[Fernando Rosa Dias]
Edição bilingue: português-inglês.