Tomás Maia: «Fala Mariam escreverá, lapidarmente: é “a figuração abstracta” — a própria essência da pintura porquanto “figurar é o mais próprio do ofício do pintor de Arte”. Aquela espécie de novelo a tracejado — que se desenrola de pintura para pintura, pelo menos desde a série do retiro — figura a própria potência de figurar. Diagrama materno: novelo, casulo, cápsula, célula, meteorito, nuvem… Simples projecção que voga pelo oceano nocturno do acaso e da necessidade. (À semelhança dos caldeus, dos babilónios e dos sumérios que, observando os céus, projectaram as primeiras constelações — as primeiras figurações abstractas feitas à luz nocturna.)»
A pintura de Fala Mariam não seria possível sem a invenção do microscópio e do telescópio. Da visão vertiginosamente próxima e longínqua. Um milímetro de tela ou de papel pode corresponder a um milésimo de segundo ou a um ano-luz. Aí, o nosso olhar muda, constantemente, de escala: os olhos vagueiam, sem referencial fixo, pelo espaço infindo e pelos interstícios da matéria. Como se o estranho balão de Odilon Redon tivesse, enfim, cumprido o seu destino: ser o olhar de uma pintora.
[Tomás Maia]
Com ensaio de Tomás Maia.
Edição bilingue: português-inglês.